O romance psicológico

LITERATURAGÊNEROS LITERÁRIOS

George Lucas Casagrande

7/15/20252 min read

A ciência que estuda a mente humana avançou ao longo da história e, com isso, o tratamento do tempo ficcional e a composição dos personagens também evoluíram. Esse tipo de romance mergulha diretamente na alma das personagens.

Ora, como ler Dom Casmurro (1899) e não ter a sensação de estar diante de uma narrativa singular? Como atravessar os labirintos literários de Clarice Lispector sem concluir que estamos diante de uma escrita que explora profundamente o interior do ser humano?

A tentativa do autor de uma narrativa psicológica é dar grande credibilidade à história. Além disso, é importante saber que esse tipo de romance exige maior esforço cognitivo por parte do leitor, o que o diferencia de outras formas narrativas. Um dos artifícios mais usados pelos romances de teor psicológico é o fluxo de consciência, técnica narrativa que busca reproduzir o curso natural dos pensamentos de uma personagem, muitas vezes de maneira desordenada e espontânea, como se o leitor estivesse dentro da sua mente.

Um exemplo dessa técnica está no seguinte trecho de Clarice Lispector:

“Mas a vida arrepiava-a, como um frio. Ouvia o sino da escola, longe e constante. O pequeno horror da poeira ligando em fios a parte inferior do fogão, onde descobriu a pequena aranha. Carregando a jarra para mudar a água – havia o horror da flor se entregando lânguida e asquerosa às suas mãos. O mesmo trabalho secreto se fazia ali na cozinha. Perto da lata de lixo, esmagou com o pé a formiga. O pequeno assassinato da formiga. O mínimo corpo tremia. As gotas d’água caíam na água parada do tanque. Os besouros de verão. O horror dos besouros inexpressivos. Ao redor havia uma vida silenciosa, lenta, insistente. Horror, horror. Andava de um lado para outro na cozinha, cortando os bifes, mexendo o creme. Em torno da cabeça, em ronda, em torno da luz, os mosquitos de uma noite cálida. Uma noite em que a piedade era tão crua como o amor ruim. Entre os dois seios escorria o suor. A fé a quebrantava, o calor do forno ardia nos seus olhos.” – Clarice Lispector

Autores como James Joyce, William Faulkner, Franz Kafka e Virginia Woolf se notabilizaram por esse subgênero. No Brasil, além dos já citados Machado de Assis (em sua segunda fase) e Clarice Lispector, destacam-se também Lúcio Cardoso e Lygia Fagundes Telles.

No cinema, ecos do romance psicológico podem ser percebidos em filmes como Ilha do Medo (2010), dirigido por Martin Scorsese, e Brilho Eterno de uma Mente sem Lembranças (2004), dirigido por Michel Gondry.