Formas medievais do gênero dramático

LITERATURAGÊNEROS LITERÁRIOS

George Lucas Casagrande

Durante a Idade Média, a produção teatral esteve profundamente ligada ao universo religioso, refletindo o predomínio da teologia na cultura e na vida cotidiana. As formas dramáticas desse período surgiram, em grande parte, como instrumentos pedagógicos e espirituais, destinados a instruir o povo sobre passagens bíblicas, virtudes cristãs e episódios ligados à fé.

O mistério

Os mistérios eram peças religiosas que dramatizavam episódios da vida de Cristo ou passagens do Antigo e do Novo Testamento. Tinham função catequética, buscando aproximar o conteúdo bíblico do público leigo por meio da encenação.

O milagre

Os milagres representavam histórias de santos, mártires e personagens piedosos cujas vidas eram exemplos de devoção. Eram obras com forte intenção moralizante, destinadas a reforçar virtudes cristãs e transmitir ensinamentos éticos à comunidade.

O auto

Também chamado auto sacramental, o auto era uma forma teatral de caráter religioso especialmente difundida na Espanha e em Portugal. No Brasil, foi introduzido por José de Anchieta, que escreveu e encenou diversos autos com a participação de indígenas, utilizando português, latim, espanhol e tupi. Essas peças tratavam de questões teológicas, dilemas morais e representações alegóricas da fé cristã.

A farsa

Embora tenha raízes na Grécia Antiga, a farsa ganhou grande destaque na Idade Média. O termo vem do francês farcir, “rechear”, pois inicialmente consistia em pequenas cenas cômicas inseridas entre os autos religiosos para divertir e manter o interesse do público. Suas características incluem humor popular, situações grotescas, crítica social e, por vezes, elementos escatológicos.

A farsa mostrou-se extremamente duradoura e subversiva, funcionando como uma válvula de escape para o espectador medieval. Como observa Pavis (1999, p. 164), por meio da farsa “o público se vinga das opressões da realidade e da razão prudente; as pulsões e o riso libertador triunfam sobre a inibição e a angústia trágica”.