Em 2026, tome cuidado, não faça de si mesmo uma máquina

"2026 vai chegar, e com ele virão novamente os planos nobres, ambiciosos, cheios de boas intenções, não podemos negar. Mas já se acostume: não vai funcionar. Ou vai funcionar pela metade. Menos da metade, talvez. Muita coisa que você pensou vai se perder nessa coisa imprevista e misteriosa, cheia de acidentes, mas também por isso deliciosa, chamada vida."

ARTIGOS

George Lucas Casagrande

"Estude, enquanto eles dormem. Trabalhe, enquanto eles se divertem. Lute, enquanto eles descansam. Depois viva, o que eles sempre sonharam.” (Será? Grifo meu) – Autor Desconhecido

Daqui a pouco, é final de ano. E quando, em meio a fogos e roupas supersticiosas, entrarmos em 2026, entrarão também nossas tradicionais listas de metas para o novo ciclo. Perder peso encabeça quase todas. Comer melhor vem logo em seguida. Ser mais paciente com as pessoas. Mais amoroso com a família. Quem sabe ler mais livros? Ou desfrutar mais da natureza. Ficar menos no celular, certeza. E, se sobrar tempo, sentar em algum lugar calmo, cruzar as pernas e simplesmente meditar.

Pois é. Mas todos hão de concordar que, no final de janeiro, ou, sendo otimista, no início de março, muitas dessas promessas já terão ido para o espaço. Ou, pelo menos, boa parte delas. As metas, sem dúvida nobres, evaporam diante do cotidiano cada vez mais massacrante. Outras metas acabam sendo impostas a nós. Ganhamos peso (estamos envelhecendo). Comemos fast food depois de um dia cansativo. Nos estressamos por qualquer besteira. Continuamos pendurados no celular. Roemos mais unhas. E assim vamos vivendo, do jeito que dá. Sou muito pessimista? Pode ser que sim, mas você não pode dizer que estou mentindo, caro leitor.

Eu mesmo, quando revisito as listas de anos anteriores, me deparo com coisas engraçadas. Não entrei no curso de inglês que tanto desejava. Não procurei um clube de sinuca para jogar nos fins de semana. Não entrei na academia. Não deixei de beber cerveja. Muitos desses planos, inclusive, hoje me arrancam gargalhadas, pois a vida, em seu curso imprevisível, e também meus diversos humores, acabaram transformando meus interesses. O curso de botânica que tanto quis fazer ficou para trás. Em 2026, acho difícil, quem sabe no futuro?

Mas, ao menos, sei que não estou nem um pouco sozinho. A procrastinação, o ato de adiar tarefas mesmo conhecendo suas consequências negativas, substituindo-as por atividades mais fáceis ou prazerosas, ou simplesmente não fazendo nada do que se havia planejado, é um mal que cresceu muito em nosso tempo, mas não nasceu nele. Os gregos já se preocupavam com esse dilema: Aristóteles falava da akrasia, a fraqueza da vontade, quando o sujeito sabe o que deve fazer, mas escolhe o contrário. Em suma, desistir.

Talvez devêssemos, antes de nos culpar tanto, parar e pensar com um pouco mais de honestidade. O celular, esse aparelho tão criticado em meus textos por aqui, atrapalhou demais nossa rotina, mas também não podemos negar que essa histeria contra a procrastinação nasce da crença moderna de que somos constantes o tempo todo. Pois não somos, e você sabe bem disso. A vida insiste em nos testar diariamente. Como manter todas as metas nessa montanha-russa que é a existência? Que me perdoem os fãs de Pablo Marçal e companhia, mas é impossível ser constante o tempo inteiro.

Você pode até me perguntar: ora, se a rotina nos exaure tanto, não deveríamos aproveitar o pouco tempo que nos resta para fazermos algo por nós mesmos? Sem dúvida, é uma indagação legítima. Mas eu devolvo com outra pergunta: se o tempo livre já é escasso, vale a pena acrescentar ainda mais peso sobre nossos próprios ombros? Não tenho nenhuma fórmula mágica para viver melhor, mas é impossível ignorar o fato de que o fardo que nós mesmos criamos, em nome da produtividade e do desempenho, tem se mostrado cada vez mais nocivo. É daí que chegamos, parafraseando o escritor Byung-Chul Han, à sociedade do cansaço.

Em uma sociedade que nos esgota e faz o ano parecer ter apenas cem dias, como não ir ao happy hour depois daquela sonhada promoção no emprego? Como não se esbaldar em chocolates depois de uma amarga desilusão amorosa? Como negar mais um pedaço de bolo no aniversário de um parente querido que não víamos há tanto tempo? Pois é, a vida é uma disputa constante entre o imediato e o duradouro. E, convenhamos, o curto prazo é um tirano quase invencível, mas nem sempre ruim.

2026 vai chegar, e com ele virão novamente os planos nobres, ambiciosos, cheios de boas intenções, não podemos negar. Mas já se acostume: não vai funcionar. Ou vai funcionar pela metade. Menos da metade, talvez. Muita coisa que você pensou vai se perder nessa coisa imprevista e misteriosa, cheia de acidentes, mas também por isso deliciosa, chamada vida. “A vida é uma sucessão de acasos e desastres”, disse Rubem Fonseca. Talvez o segredo esteja justamente em aceitar essa errática característica da existência e, em vez de tentar dominar o tempo, aprender a caminhar com ele. Mas um dia de cada vez, por favor.